O jornalismo cultural brasileiro virou um zumbi? Hoje a Folha publicou textos sobre duas exposições recém inauguradas na Oca: “Corpo Humano – Real e Fascinante” e a mostra dedicada a Leonardo Da Vinci. O mais assustador é que as duas matérias dão um foco especial ao fato de as obras serem "cópias", isso num tom moralista e alarmista, como se todos os problemas da arte se reduzissem à “reprodutibilidade técnica”, premissa benjaminiana citada – previsivelmente – por um dos críticos. Os estudos de Da Vinci foram realizados por copiadoras de fundo de quintal, enquanto os cadáveres plastinados de Glover são fumês espelhados, replicações oportunistas calcadas na polêmica exposição de Von Hagens. Vale tirarmos da estante o livro The Future of the Past, de Alexander Stille, para professorarmos aos senhores críticos que fac-símiles, no campo da arte e da cultura, são considerados, por mentalidades não ocidentais, obras sublimes que, em determinadas circunstâncias, até ultrapassam em excelência o objeto original. Senão, vejamos: na língua chinesa, segundo Stille, há duas expressões diferentes para "cópia": fang zhipin é o que mais se aproxima ao que nós, pobre ocidentais, chamamos de reprodução, ou seja, uma cópia barata e sem esmero. Já fu zhipin significa uma cópia perfeita, de alta qualidade, não raramente superior à matriz. Há, convenhamos, certa sabedoria nesta distinção. Ou não?
UPDATE (1/03): Há um museu nos EUA que se recusou a receber a exposição dos guerreiros de terracota de Xi’an (expostos há pouco tempo na mesma Oca), pelo fato de serem réplicas. Aqui, a mesma revelação causou choque e descrédito em muita gente. Dentro do mesmo assunto, o professor W. J. T. Mitchell, da universidade de Chicago, escreveu um paper sobre o impacto da genética e da ciência da computação na arte contemporânea, comparando a época atual com o momento da "revolução" de Walter Benjamin.